
As pequenas e médias empresas (“PME”) incluem as Entidades que não sejam companhias abertas, reguladas pela Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”), as sociedades de grande porte, como definido na Lei nº. 11.638/07, as sociedades reguladas pelo Banco Central do Brasil, pela Superintendência de Seguros Privados e outras sociedades cuja prática contábil seja estabelecida por correspondente órgão regulador. A norma emitida pelo IASB para estas Entidades foi resultado de um projeto de 5 anos para abordar as necessidades de demonstrações financeiras destas pequenas e médias empresas, com principal objetivo de simplificar as exigências para Entidades menos complexas e reduzir o custo e esforço necessários na elaboração das demonstrações financeiras utilizando-se de conceitos do IFRS.
No Brasil, pelos dados do Sebrae, a maior parte das Entidades se classifica como PME, o que demonstra a abrangência da aplicação dessa norma por essas Entidades. No entanto, historicamente um grupo específico destas PMEs tem dificuldades na aplicação da norma, deixando de se utilizar dos benefícios de simplificação em relação ao IFRS completo pelas necessidades de reporte a controladores que por sua vez não sejam PMEs. Em comentários enviados ao IASB no passado, diversas Entidades comentaram a pouca atratividade em se aplicar o IFRS para PME na medida em que isso criaria a necessidade de se manter duas contabilidades em paralelo, sendo o IFRS PME para seus registros estatutários e o IFRS completo para reporte ao controlador para fins de consolidação. Ou seja, há pouco benefício em se aproveitar exceções significativas disponíveis para PMEs como, por exemplo, as relacionadas a recuperabilidade de ágio e outros ativos intangíveis, custos de empréstimos, combinações de negócios, entre outros, se para fins de reporte ao controlador estes procedimentos precisam ser incluídos de qualquer maneira.
O IFRS para PMEs deriva de conceitos do Framework do IFRS, de forma que haja um alinhamento nos conceitos aplicados que não sejam dissonantes entre si e que respeitem as características qualitativas de informação em demonstrações contábeis (compreensibilidade, comparabilidade, materialidade, relevância, confiabilidade, entre outras). No entanto, certas simplificações permitidas enquanto trazem grande benefício para uma Entidade que se inclua como uma PME, geram duplicidade no trabalho de elaboração de relatórios financeiros quando esta mesma Entidade seja requerida a reportar números aos controladores em bases IFRS completas.
Soma-se a isso, o relativo atraso nas normas PME no que diz respeito a revisões relevantes (ou novas normas) nos IFRSs nos últimos anos que alteraram princípios associados a determinados saldos e que não foram refletidos na norma para PMEs, como no caso de reconhecimento de receita, arrendamentos ou mesmo mudanças no Framework e conceitos de materialidade na apresentação de demonstrações financeiras. Nesse sentido é importante acompanhar o outro projeto separado do IASB de revisão abrangente do IFRS para PMEs, que encerrará nos próximos dias o período de recebimento de comentários e seguirá para a elaboração de um Exposure Draft que fundamentará a nova norma revisada, onde grande parte dos descasamentos existentes entre as normas serão tratados.
No que diz respeito às Entidades PMEs que seguirão com os requerimentos de reporte em IFRS completo, o IASB iniciou um projeto com o pressuposto de criação de uma norma que seja especificamente endereçada a essas Entidades (não confundir com o projeto de revisão do IFRS PME, mencionado acima). Embora ainda esteja em fase embrionária, o resultado do projeto levaria a uma norma que alinhe as premissas de reconhecimentos e mensuração aplicáveis a essas Entidades PMEs aos estabelecidos pelo conjunto completo das IFRS. Espera-se que determinadas simplificações do IFRS PME não sejam provavelmente refletidas nessa nova norma, uma vez que criariam divergências significativas com estas, como no reconhecimento inicial (ou a falta dele) de ativos intangíveis, custos de empréstimo, combinações de negócios, entre outros. Outras simplificações, por outro lado, devem se manter. Instrumentos financeiros, embora envolva no IFRS PME classificações diferentes do IFRS 9, Financial Instruments (o CPC 48, Instrumentos Financeiros, como codificado pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis no Brasil), devem seguir com maiores facilidades de aplicação às PMEs, uma vez que conceitos relevantes como o do valor justo já são presentes e aplicados aos instrumentos financeiros não avaliados como básicos pelo IFRS PME. Notadamente, não se espera ainda que Entidades PMEs possuam instrumentos financeiros altamente complexos que, de outra forma, devessem estar endereçados pelo IFRS 9.
Esse padrão seria especialmente relevante no Brasil em determinados setores onde há forte participação de capital estrangeiro com representação obrigatória por uma filial nacional, como ocorre, por exemplo, em atividades extrativas, nas quais comumente Entidades globais operam no Brasil por meio de uma subsidiária nacional mas utilizando-se em sua grande parte de estruturas e ativos do controlador no exterior.
O custo de se prover informações únicas tanto localmente quanto para fins de reporte certamente seria um benefício se comparado aos requerimentos atuais e, como intuito principal não somente da norma mas de toda a estrutura de normatização do IASB, proveria benefícios diretos pela uniformidade da informação prestada em cada jurisdição onde a Entidade opera. Novas rodadas de discussão devem ocorrer ainda em 2020, bem como um alinhamento mais claro quanto aos rumos do projeto pelo IASB. Pela relevância, em conjunto com o projeto de revisão abrangente do IFRS para PMEs em andamento, deve ser foco de atenção das Entidades que se qualifiquem nessa definição.