Instrução Normativa BCB nº 627: Novas Categorias no SCR e Fortalecimento da Gestão de Risco de Crédito

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Instrução Normativa BCB nº 627: Novas Categorias no SCR e Fortalecimento da Gestão de Risco de Crédito

Contexto e Fundamentos Legais da IN BCB 627

A Instrução Normativa BCB nº 627 trata de atualizações no Documento de código 3040 — Dados de Risco de Crédito, integrante do Sistema de Informações de Créditos (SCR). O SCR foi estabelecido pela Circular BCB nº 3.567/2011, que dispõe sobre o envio de informações de operações de crédito ao Banco Central do Brasil. O Documento 3040, enviado mensalmente por cada instituição financeira, contém dados individualizados das operações de crédito para fins de supervisão. Essas informações alimentam a base do SCR e permitem ao Banco Central monitorar a exposição ao risco de crédito do sistema financeiro.

A IN BCB 627 foi emitida com respaldo nas competências legais do Banco Central para regulamentar sistemas de informação de crédito, em conformidade com a Resolução CMN nº 3.658/2008 (que instituiu o SCR) e a legislação aplicável. Importante destacar que a edição dessa normativa ocorreu em um contexto de aperfeiçoamento contínuo do arcabouço prudencial e em alinhamento a novas políticas públicas setoriais. Em especial, a Lei nº 14.995/2024 — sancionada em 10 de outubro de 2024 — criou o Programa Eco Invest Brasil, um programa governamental de mobilização de capital privado externo com proteção cambial para projetos ambientais. Também o Conselho Monetário Nacional (CMN) editou a Resolução nº 5.130/2024 para regulamentar a linha de financiamento Eco Invest Brasil, posteriormente aperfeiçoada pela Resolução CMN nº 5.205/2025. Assim, a IN 627 fundamenta-se na necessidade de incorporar essas novidades legais e regulamentares à base de dados do SCR, garantindo que as instituições financeiras reportem informações compatíveis com os novos tipos de operações e programas vigentes.

Cabe mencionar que, conforme o Decreto nº 10.411/2020, a obrigatoriedade de Análise de Impacto Regulatório (AIR) pode ser dispensada quando o ato normativo apenas disciplina obrigações definidas em norma superior, sem apresentar opções regulatórias possíveis. De fato, a IN BCB 627 se enquadra nessa hipótese, motivo pelo qual não houve necessidade de AIR, decisão amparada pelo art. 4º, inciso II, do referido Decreto. Em outras palavras, tratam-se de alterações pontuais e necessárias para manter a aderência da regulação infra-legal às leis e resoluções recentes, com baixo impacto incremental em termos de custos regulatórios.

Alterações no Documento 3040: Leiaute e Instruções Atualizadas

A IN BCB 627 alterou o leiaute, as instruções de preenchimento e as instruções complementares do Documento 3040 — Dados de Risco de Crédito. Em linha com medidas anteriores do Banco Central, essas alterações visam aprimorar a qualidade e a granularidade dos dados enviados ao SCR. Na prática, foram ajustados os campos e códigos do formulário eletrônico (que é estruturado em formato XML) para acomodar novas classificações de operações, bem como modificadas descrições de códigos existentes para melhor refletir a natureza das operações.

Entre as mudanças técnicas no leiaute, destaca-se a descontinuação do campo COSIF a partir da competência de janeiro/2025, simplificando o reporte ao eliminar a necessidade de informar códigos do plano contábil em cada operação. Adicionalmente, foram atualizados domínios de campos agregadores e características especiais, conforme descrito nos anexos do leiaute, de forma a incorporar novas categorias e eliminar códigos obsoletos. Por exemplo, o código de Característica Especial nº 22 teve sua descrição alterada para representar uma nova condição de operação (conforme detalhado a seguir), substituindo a descrição anterior que havia se tornado menos relevante. Da mesma forma, os domínios 01 e 04 do Anexo 37 (Tipo de Uso Regulatório) foram redefinidos para contemplar programas governamentais atuais no crédito, em substituição a programas encerrados nos últimos anos.

Vale lembrar que alterações semelhantes no Documento 3040 já vinham ocorrendo periodicamente. Em 2024, a IN BCB 531/2024 promoveu mudanças no leiaute relacionadas a programas de estímulo creditício anteriores (como Pronampe, CGPE e PEC), atualizando descrições de códigos para refletir a vigência desses programas. Agora, com a IN 627, o Banco Central incorpora as necessidades informacionais decorrentes do Programa Eco Invest Brasil e de novas operações de crédito, conforme descrito a seguir, mantendo o SCR atualizado em relação às políticas de crédito e práticas de mercado recentes.

Novas Categorias Incluídas no Documento 3040

A principal inovação trazida pela IN BCB 627 foi a inclusão de novas categorias de operações de crédito no escopo do Documento 3040. Essas categorias permitem identificar no SCR tipos específicos de operações que antes não eram distinguidos, aprimorando a visibilidade do Banco Central sobre certos ativos e características de operações. As principais inclusões foram:

  • Precatórios Adquiridos: operações de crédito referentes à aquisição de precatórios (dívidas judiciais da Fazenda Pública) por parte de instituições financeiras. Agora, os precatórios comprados de terceiros passam a ser reportados separadamente no SCR, diferenciados de outros créditos. Essa categorização foi suportada por alterações no plano contábil no final de 2023 e em 2024, que criaram rubricas específicas para precatórios adquiridos (segregando-os por ente federativo e conforme o registro público). Com a IN 627, as instituições devem marcar as operações lastreadas em precatórios comprados, o que traz maior transparência sobre a exposição dos bancos a créditos contra o setor público resultantes de decisões judiciais.

  • Direitos Creditórios em Processo de Execução (Adquiridos): semelhante ao caso dos precatórios, foi criada categoria para identificar direitos creditórios em fase de execução judicial adquiridos por instituições financeiras. São, em geral, créditos inadimplidos ou em cobrança judicial que bancos ou fundos compram de outras instituições ou credores originais. A partir de agora, essas operações são informadas distintamente, indicando se o crédito adquirido já se encontrava em processo de execução. Essa inclusão acompanha modificações nas rubricas contábeis que passaram a distinguir créditos em execução próprios e adquiridos, inclusive diferenciando aqueles com registro público (decorrentes de processos judiciais formalizados). O objetivo é permitir ao Banco Central monitorar mais de perto a participação de ativos estressados/adquiridos nos balanços das instituições, dado seu perfil de risco mais elevado.

  • Operação Sindicalizada: foi adicionada uma característica especial para sinalizar quando a operação de crédito é sindicalizada, ou seja, concedida conjuntamente por um sindicato de instituições financeiras. Nessa situação, normalmente múltiplos bancos compartilham o crédito a um mesmo tomador sob um único contrato, diluindo os riscos. A nova marcação “Operação Sindicalizada” (atribuída via código específico de característica especial) permitirá identificar essas operações no SCR. Antes, as operações sindicais eram reportadas sem destaque específico; com a mudança, o Banco Central poderá extrair informações agregadas sobre o volume de crédito sindicalizado no sistema. Essa visibilidade é relevante, pois operações sindicadas costumam estar associadas a financiamentos de alto valor ou projetos estruturados, cujos riscos são distribuídos entre várias instituições.

  • Operações Contratadas no Âmbito do Programa Eco Invest: em consonância com a criação do Programa Eco Invest Brasil, o leiaute do Documento 3040 passou a prever a identificação das operações de crédito concedidas sob esse programa. O Eco Invest Brasil, conforme estabelecido pela Lei 14.995/2024 e regulamentação do CMN, viabiliza financiamentos de projetos com enfoque sustentável, contando com aporte de capital externo e hedge cambial público. Com a IN 627, as instituições deverão marcar os financiamentos realizados no âmbito da linha Eco Invest, utilizando a categoria específica prevista (provavelmente no campo “Tipo de Uso Regulatório” ou equivalente). Essa inclusão facilita o acompanhamento, pelo Banco Central, da implantação do programa em termos de volume de crédito liberado e perfil dessas operações “verdes”. Ademais, alinha-se aos objetivos de transparência e avaliação de política pública, permitindo gerar estatísticas agregadas do Eco Invest e verificar seu impacto no mercado de crédito.

Cada uma dessas novas categorias vem acompanhada de instruções complementares de preenchimento no manual do Documento 3040, para assegurar uma classificação consistente pelas instituições reportantes. Ao segregar esses tipos de operações, o Banco Central passa a diferenciar no SCR créditos antes agrupados em categorias genéricas, obtendo informações mais ricas sobre a carteira de crédito do Sistema Financeiro Nacional.

Monitoramento do Risco de Crédito e Estatísticas Aprimoradas

As mudanças introduzidas pela IN BCB 627 fortalecem o monitoramento prudencial e a capacidade analítica do Banco Central. Com dados mais detalhados, a autoridade de supervisão pode identificar riscos específicos com maior precisão. Por exemplo, ao saber exatamente o montante de precatórios adquiridos pelos bancos, o BCB consegue avaliar a exposição do sistema a possíveis atrasos ou calotes de precatórios públicos. Similarmente, distinguir créditos em execução judicial adquiridos permite acompanhar o tamanho do mercado secundário de créditos inadimplentes e seus potenciais efeitos sistêmicos (como concentrações de ativos estressados em determinadas instituições).

A marcação das operações sindicalizadas auxilia na mensuração de riscos compartilhados: o Banco Central poderá enxergar quais grandes empréstimos estão distribuídos entre vários bancos, reduzindo a concentração de risco individual, mas eventualmente criando interdependências entre instituições. Esse tipo de insight contribui para análises de estabilidade financeira, pois operações sindicadas costumam financiar empreendimentos de grande porte — cujos eventuais problemas podem afetar múltiplos credores simultaneamente.

No caso do Programa Eco Invest Brasil, a identificação das operações no SCR permitirá tanto o acompanhamento prudencial quanto a avaliação da política pública. Do ponto de vista de risco, o BCB poderá isolar a performance dessas operações verdes, observando inadimplência, termos e volumes, sem misturá-las a outras linhas. Do ponto de vista estatístico, será possível gerar relatórios específicos sobre o crédito concedido sob o programa, informando formuladores de políticas sobre seu alcance. Dado que o Eco Invest envolve aporte de recursos internacionais e proteção cambial via Fundo Clima, é fundamental mensurar seu impacto no mercado de crédito doméstico — o que o SCR passa a viabilizar.

Importante salientar que o Banco Central divulga mensalmente estatísticas agregadas das operações de crédito recebidas pelo SCR. Ou seja, os dados enviados via Documento 3040 não servem apenas à fiscalização individual de instituições, mas alimentam indicadores públicos como volume total de crédito por modalidade, por setor, atrasos, etc. Com as novas categorias, as estatísticas oficiais poderão incorporar recortes mais granulares — por exemplo, divulgando o estoque de operações Eco Invest no sistema, ou o montante de créditos de precatórios detidos pelos bancos. Essas informações enriquecem a compreensão do mercado e podem subsidiar tanto decisões de política monetária e macroprudencial, quanto iniciativas governamentais de crédito direcionado.

Em síntese, a IN BCB 627 aprimora a qualidade da informação disponível para a gestão do risco de crédito. Ao exigir das instituições financeiras uma identificação pormenorizada de certas características de suas operações, o Banco Central reforça sua capacidade de supervisionar a solvência e a exposição ao risco das entidades, bem como de gerar estatísticas confiáveis para acompanhamento da evolução do crédito na economia.

Considerações Finais

A atualização promovida pela Instrução Normativa BCB nº 627 demonstra a agilidade do Banco Central em adequar a regulamentação infralegal às inovações de mercado e às políticas públicas emergentes. A inclusão de categorias como Precatórios adquiridos, Créditos em execução adquiridos, Operações sindicalizadas e operações do Eco Invest Brasil reflete um movimento estratégico de melhorar a transparência e o detalhamento das informações de crédito disponíveis na central de riscos do BCB. Essa melhora beneficia não apenas a supervisão — com potencial de identificação precoce de riscos concentrados ou novos — mas também a formulação de políticas, permitindo avaliar o impacto de programas de crédito como o Eco Invest de forma mais objetiva e baseada em dados.

Com a dispensa de análise de impacto regulatório devidamente justificada pela natureza específica das alterações, a norma entrou em vigor sem entraves burocráticos, garantindo que já nas próximas remessas mensais ao SCR as instituições financeiras passem a reportar os dados conforme o novo leiaute. Espera-se que, a partir dessas mudanças, o Banco Central do Brasil disponha de um arcabouço informacional ainda mais robusto para cumprir sua missão de zelar pela solidez do sistema financeiro e fomentar a sustentabilidade e eficiência do mercado de crédito brasileiro.